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Silenciamento e Sexualidade
Ayrton Oliveira
O tema desta reunião reflexiva emergiu da escassez de discussões do tema ‘Sexualidade, Corpo e Gênero’ (SCG) dentro da escola e da universidade. Por que seriam SCG silenciados nos currículos? Na tentativa de compreender algumas respostas a esta pergunta fui a procura de artigos que tratassem do tema e selecionei um de autoria de Nadia Novena (Referência completa no final da página) por tratar o tema dentro da perspectiva da análise discursiva francesa. Ela trabalhou elevando o SILÊNCIO dos temas SCG a um lugar de destaque na compreensão da construção dos sujeitos alunos e sujeitos professores.
A leitura do texto não foi enviesada por antecipação de perguntas; queria buscar as real percepção individual do tema. Apesar disto um fato foi unânime na sensibilização dos bolsistas: o choque de realidade com a leitura dos trechos de entrevistas apresentados por Nadia Novena. Um choque gerado do distanciamento da realidade analisada (escola) e da realidade vivida por nós (universidade).
Iniciei a reunião com a questão que apresentei no primeiro parágrafo deste texto, por esta ser a minha inquietação. Diversos pontos foram levantados e muito discutidos, mesmo assim ficou evidente em muitas falas que o tema SCG é pouco explorado na formação docente, acarretando num despreparo que distancia o professor destas questões na escola. Despreparo que dificulta até mesmo a busca autônoma por informações que fujam dos “achismos” circulantes na sociedade.
Outros sentidos percebidos deste silenciamento decorrem da infantilização que se cria dos alunos. Um processo que coloca a criança e o adolescente como “tabulas rasas”, de forma que o tema torna-se tabu; silencia-se o tema para que a criança não se aproprie destas ideologias – diversidade sexual e igualdade de gênero. Um reflexo de uma sociedade ainda patriarcal cis-heteronormativa.
Foi indiscutível a necessidade de nós, como professores de biologia, trabalharmos também estes temas. Porém sempre recaímos na biologização do tema SCG; questões como gravidez, DST’s, e dimorfismo sexual fazem parte dos estudos em SCG, porém não devem ser tomados como o cerne destas questões. A sexualidade humana é muito mais do que um complexo hormonal-fisiológico, é cultural, social, emocional, e, portanto não pode ser reduzida a apenas uma destas componentes. Devemos trabalhar com a complexidade deste tema. Justamente por isto ele é entendido como tema transversal.
Mas como trabalhar de maneira transversal numa escola que dificulta a aproximação entre professores de diferentes áreas? Como nós, com uma única formação – deficitária ainda para os temas SCG – conseguirei trabalhar sozinho na complexidade do tema? Estas perguntas vieram a tona, porém suas respostas não são claras nem estáticas; elas estão em constante reformulação, e surgem da nossa reflexão. Como dito por nosso orientador, devemos trabalhar no sentido de nossos alunos reconhecerem uns nos outros uma humanidade.
Por fim gostaria de voltar ao choque inicial que tivemos; o que diferencia nossa realidade (na universidade) da realidade de muitas escolas pelo Brasil? Mais uma pergunta que não conseguirei responder aqui. Mas uma proposta do professor Marco Randi (nosso orientador) me fez vislumbrar esta resposta; olhar para sua própria trajetória quanto a sua sexualidade, desde a escola até a universidade. Perceber como foi a vivência social desta sexualidade, seja ela heterossexual, homossexual, cis-gênero, transgênero, etc., como os outros a percebiam – normal?, anormal? – e como você mesmo a percebia, foi fundamental ao desestranhamento da realidade apresentada por Nadia Novena. Deixo então esta prática do professor Randi como ponto de partida para nossa reflexão antes estranharmos aquilo que iremos vivenciar em sala de aula; compreendamos as condições de produção dos sentidos circulantes de ‘Sexualidade, Corpo e Gênero’ para podermos propor práticas mais significativas.
Texto de referência:
NOVENA, Nadia Patrizia. PROCESSOS DE SILENCIAMENTO DA SEXUALIDADE NA ESCOLA: REPERCUSSÕES PARA A PRODUÇÃO DAS SUBJETIVIDADES DOS ATORES ENVOLVIDOS NESTA ORGANIZAÇÃO. M.A.U.S.S.. [s.i], 2004. Disponível em: <https://goo.gl/69q0BP>. Acesso em: 05 abr. 2017.